Este fim de semana disputou-se a 25ª edição de uma das provas que desde o seu inicio me fascinou e então desde que também participei posso dizer que foi uma das melhores experiências por que passei.
E como nasceu sob o espírito da Aventura cada uma das minhas participações foram também uma pequena aventura.
A primeira participação, ou melhor, tentativa de participação foi na edição de 1990, em que pouco mais de um mês antes da prova disseram-me que havia em Alcobaça um boca-de-sapo que tinha participado em duas ou três provas de todo terreno. Como um dos sonhos que sempre tive, e até hoje ainda não realizado, foi o de participar numa prova com um boca-de-sapo, fui à procura dele. Pergunta daqui, pergunta dali, lá descobri o "raio-azul" como ele era chamado pelos mecânicos que lhe davam assistência. Estava com muito mau aspecto e pelo que disseram tinha parado porque tinha o carter estalado. Mas como nestas coisas o coração fala mais alto do que a razão, toca de comprar o carro, inscrever para a prova, que entretanto já era daí a menos de um mês e mãos à obra para trocar o carter, que implicava tirar toda a mecânica fora. Feita a troca verificamos que o motor não sofria só de carter estalado, estava mesmo muito debilitado, fomos fazer um teste e verificámos que tudo estava doente, motor, suspensão, travões, etc. mas mesmo assim ainda não tínhamos desistido, e faltava ainda colocar as portas, que o carro vinha com umas lonas no local das portas da frente porque era mais leve, pelo que me disseram, mas ao tentar colocar as portas é que verificámos a verdadeira razão delas não estarem lá, o carro estava todo vergado, tipo arco de púa e as portas não cabiam no sitio. Dois ou três dias antes da prova lá resolvemos que era melhor aproveitar as noites para dormir do que tentar por o carro a andar, e assim a participação de 1990 acabou antes da prova começar.
Mas como o bichinho estava lá, no ano seguinte resolvi inscrever-me novamente, desta vez não com o boca-de-sapo mas com um Toyota Starlet que tinha sido do troféu e com o qual tinha participado no Rali do Algarve de 1987 e 1989 e que na altura servia de carro de dia a dia.
Foi então feita uma preparação "profunda", colocaram-se umas bolachas na suspensão para o levantar um pouco, dois ou três centímetros, os amortecedores foram ao Porto para o amigo Jorge os afinar como só ele sabe, colocou-se a protecção inferior já utilizada no Algarve, duas bilhas para levar água com isostar e com um tubinho até a boca, e fomos à procura dos pneus que nos tinham sido oferecidos pelo João Almeida e usados no Rali do Algarve de 1989, e levamos umas 3 ou 4 cintas de reboque, porque sempre que eu contava a alguém o que ía fazer ofereciam-me uma e diziam, leva isto que vai ser o que mais vais precisar.
Desta vez fomos mesmo até ao inicio da prova, que começou com o prólogo, numa sexta feira muito chuvosa. Comecei logo a pensar que ía mesmo ter que usar as cintas, mas não, lá fomos patinando de curva em curva e o único susto foi a meio do prologo quando resolvi esticar-me um pouco e ia deixando uma roda num calhau depois de andar "aos papeis", foi como que um abre olhos, pois ia para uma prova de 500 km's e quase deitei tudo a perder só para fazer bonito para o publico.
Chegamos então ao grande dia, em que ia-mos disputar a Baja que era feita toda em linha, o relógio começava a contar no inicio e só parava após 500 kms, tempo de assistência incluído. O tempo estava bom pois tinha parado a chuva e assim podia ser que não tivesse que usar as cintas. Lá fomos andando calmamente num ritmo certinho para não se perder muito tempo mas também para não partir o carro. Por volta do km 100 o primeiro susto, o carro começa a soluçar e acaba por parar, vamos ver, tinha sido o suporte da bateria (que tinha sido reforçado, pois levava uma bateria maior) que se tinha partido e arrancado o cabo da massa. Feita uma ligação de improviso e amarrada a bateria com uma correia, lá seguimos até a primeira zona de assistência para por gasolina, mas antes ainda tivemos que passar a famosa ribeira de Seda, com direito a pés de molho e tudo, mas sem ter que usar as cintas de reboque.
A partir daí foi sempre rolando no nosso ritmo, apenas com mais um ou dois contratempos, como uma subida de areia que foi feita de marcha atrás porque de frente patinava e não subia e mais um engarrafamento numa zona de lama em que tivemos que usar a cinta para ajudar outro concorrente, e depois para nos tirarem, e ainda mais uma situação de principiante, numa zona em que atravessá-mos umas dez ribeiras de pouca profundidade resolvi passar em força numa em que havia muito público, para fazer mais um bonito, e claro está que devia ter imaginado porque é que toda a gente tinha ido para aquela e não para uma das outras, é mesmo isso, essa era a funda e grande mergulho que até passou água por cima do carro, mas como o embalo era tanto passamos para o outro lado, onde estivemos um bocado com o carro a trabalhar em 1 ou 2 cilindros, até que os outros secaram e lá seguimos viagem, com umas pequenas paragens de hora a hora, porque nos tinham dito que o isostar era muito bom para aguentar o dia todo sem fome, o que foi verdade, só não tinham dito que de hora a hora tinha que se verter o usado.
No final foi uma das melhores experiências por que passei e o resultado foi muito acima do esperado, a principal vitória que foi o chegar ao fim, num dos anos que terminaram mais carros de 2 rodas motrizes, e o 2º lugar dessa categoria de 2 rodas motrizes, junto à vitória dos carros até 1.300 e primeiro tracção à frente. Curiosamente quem apareceu como vencedor dos duas rodas na imprensa foi o que ficou em terceiro.
E foi um dos últimos anos em que se podiam fazer Aventuras destas, porque a partir daí começou tudo a ser muito mais profissionalizado e os custos subiram para valores incomportáveis para o espírito com que isto se faziam, mas a mística de Portalegre ainda hoje se mantém muito à custa destes tempos e aventuras destas.
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